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  • Fernando Bortoluzzi

Campanhas em Crise

Atualizado: 20 de dez. de 2020

As Eleições Municipais de 2020 em meio à pandemia de Covid-19


Fernando Bortoluzzi e Stefania Martinelli


O primeiro ano da década de 2020 já era visto como um ano de mudanças: 147,9 milhões de eleitores iriam às urnas para escolher os próximos prefeitos e vereadores dos 5.570 municípios brasileiros. Porém, com o primeiro caso de coronavírus registrado no Brasil em 17 de março e a crescente acelerada dos números, as Eleições Municipais de 2020 precisaram ser reavaliadas.


Em 4 de outubro, dia em que seria originalmente realizado o primeiro turno, o Brasil chegou à marca de 4.914.906 casos confirmados de Covid-19 e 146.375 óbitos, segundo balanço do consórcio de veículos de imprensa. Inúmeras mudanças no calendário eleitoral e nos protocolos foram necessárias para que o pleito pudesse acontecer sem aumentar as complicações estrondosas já causadas pela crise sanitária. Caso contrário, ele corria o risco de ser cancelado ou adiado para o ano que vem.


Com a pandemia em constante avanço ainda em maio, o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal passaram a debater possíveis saídas para que as eleições ocorressem ainda este ano. No dia 2 de julho, o Congresso optou por adiar, via Emenda Constitucional 107, as datas para a realização do primeiro e segundo turno para 15 e 29 de novembro, respectivamente. Além disso, outras datas relevantes para o calendário eleitoral foram postergadas.


As convenções partidárias, que seriam realizadas entre julho e agosto, foram realizadas entre 31 de agosto e 16 de setembro. Este também foi o período para que os partidos escolhessem seus candidatos e definissem as coligações, assim, tendo até o dia 26 de setembro para realizarem os registros das candidaturas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A campanha eleitoral teve início oficialmente no dia seguinte, 27 de setembro, quando propagandas eleitorais passaram a circular na televisão, rádio e, essencialmente este ano, na internet.


Além das mudanças no calendário, o então presidente do STF, Ministro Luís Roberto Barroso, anunciou em setembro o Plano de Segurança Sanitária para as Eleições Municipais de 2020, com a finalidade de preservar a saúde de eleitores e mesários nos dias de votação. Os protocolos foram elaborados a partir de consultoria prestada por especialistas da Fiocruz, instituição de pesquisa e desenvolvimento em ciências biológicas, e dos hospitais Sírio Libanês e Albert Einstein.


Segundo os protocolos sanitários definidos, todas as seções eleitorais deveriam ser abastecidas com álcool em gel para a higienização dos eleitores antes e depois da votação. O uso de máscaras foi obrigado pelo TSE desde a saída de casa do eleitor até o retorno. Quem apresentasse sintomas de Covid-19 não pôde comparecer ao local de votação. Os horários foram estendidos em uma hora: das 7h às 17h, com as duas primeiras horas reservadas para a preferência aos idosos, grupo de risco de contaminação. Foi indicado, ainda, que os cidadãos levassem suas próprias canetas para assinar o comprovante de votação e o uso da identificação biométrica foi suspenso para evitar a disseminação do vírus.


Para os mesários, as medidas incluíram máscaras, que deveriam ser trocadas a cada quatro horas, protetores faciais de plástico e álcool em gel para segurança individual. Não havia medidores de temperaturas, além disso, as sessões eleitorais contaram com adesivos no chão para delimitar o distanciamento nas filas de votação. Entretanto, os cartazes que exibiam ao público os procedimentos que deveriam ser seguidos não tiveram adesão total, como pôde ser observado em Chapecó, Oeste de Santa Catarina.


Com população próxima de 225 mil habitantes, Chapecó conta com o quinto maior eleitorado do estado: 151.220 votantes. No dia das eleições, o município registrava 537 casos ativos de Covid-19 e 82 óbitos. Apenas 75,82% dos eleitores compareceram à votação, sendo a pandemia um agravante para o alto índice de abstenções.


Sete coligações disputaram a Prefeitura. Com menos de 200 mil eleitores no município, ficou definida em primeiro turno a vitória de João Rodrigues, da coligação “Chapecó Acima de Tudo” (PSD, PP, PSC, PL, PROS, DEM, REPUBLICANOS), que obteve 47,66% dos votos.


Para o candidato, os maiores desafios de se fazer campanha em meio a uma pandemia foram pedir votos e levar propostas ao mesmo tempo que se evitavam aglomerações. “A pandemia reduziu o período de campanha e limitou as ações. Tivemos que tomar muito cuidado. Chegamos a cancelar lives e realizar reuniões com grupos separados. Foi um trabalho de formiguinha”, comenta o Prefeito Eleito.



O lançamento da chapa majoritária composta por João Rodrigues (PSD) e Itamar Agnoletto (PP) foi oficializada em 16 de setembro através de uma live na página do candidato no Facebook.

(Créditos: Ascom João Rodrigues/Leandro Schmidt)


 

Coronavírus: o novo adversário


Por conta da pandemia e a impossibilidade de realizar comícios e grandes encontros presenciais, as lives, ou vídeos ao vivo, tiveram papel essencial durante esse período. Para o coordenador da campanha de João Rodrigues, Ricardo Lunardi, a mudança nos eventos por conta da pandemia teve um impacto na maneira de como se deu a campanha.


Na visão dele, foi preciso se reinventar. "Não tivemos eventos com grande concentração de pessoas, comícios não existiram, então tivemos que usar as lives para substituir, o que foi muito interessante, pois tivemos uma abrangência até maior do que um comício e bem mais barato a realização de um evento nesse formato”, explica Ricardo.


Para melhor entender a visão dos eleitores sobre as eleições municipais em meio ao contexto da pandemia do novo coronavírus, realizamos uma pesquisa, divulgada em redes sociais digitais, que teve 29 participantes. Destes, 31% indicaram que as lives foram o meio mais utilizado para acompanhar as movimentações de seus candidatos.


Os participantes puderam escolher livremente entre os meios mais utilizados para acompanhar a campanha eleitoral deste ano. Os mais utilizadas foram as mídias sociais mais populares: Facebook, Twitter, Instagram e WhatsApp.


A pandemia impactou diretamente nas formas de como se deram as campanhas políticas em todo o âmbito nacional. Em Chapecó não foi diferente. Um instrumento que ganhou destaque nestas eleições foram as mídias sociais digitais. Para Ricardo Lunardi, as redes sociais que já vinham ganhando destaque nas últimas eleições, nesta em específico foram de extrema importância para a divulgação das informações do candidato.


O coordenador de campanha cita pontos positivos e negativos do uso das mídias digitais neste cenário. Para ele, ao passo que o alcance era muito maior e o custo em realizar campanha online ser consideravelmente menor, algo que causou preocupações neste meio foi a propagação de fake news.


"Nas redes sociais as pessoas são covardes, posso dizer assim porque, por conta do anonimato e essa facilidade que as redes sociais propiciam, aconteceram calúnias, criando situações desagradáveis, por isso, tivemos que montar uma equipe de monitoramento e com amparo jurídico para rebater essas inverdades", ressalta Lunardi.


Dos eleitores que participaram da pesquisa, apenas 37,9% disseram ter tido contato com alguma fake news durante a campanha, pelo menos os que estiveram atentos. Entre as citadas, a maioria são em relação à pandemia e a baixa dos números para evitar respostas que pudessem comprometer as eleições.


A maioria dos participantes afirma não ter tido contato ou identificado alguma fake news disseminada durante a campanha, sem nenhum tema específico.


Para Hugo Paulo Gandolfi de Oliveira, jornalista que atuou como comentarista político para o Grupo Condá de Comunicação, um dos maiores em Chapecó, as mídias sociais foram de alta valia e tendem a ser até mais valorizadas em 2022. “Aqueles que souberam expressar o que defendiam para o trabalho no Executivo ou Legislativo Municipal, com clareza e demonstração de veracidade de exequibilidade, tiveram os frutos, ou melhor, os votos. As televisões, pela desvalorização dos debates, perderam oportunidade de manter e ampliar a importância que têm como mídia”, comenta o jornalista.


Dentro de redes como Facebook e Instagram, uma ferramenta muito explorada foi a de impulsionamentos de publicações. Após mudanças na legislação eleitoral este ano, os candidatos puderam aplicar quantidades em dinheiro para direcionar e aumentar o alcance de suas publicações nas mídias digitais.


João Rodrigues confirma que o mecanismo foi uma boa aposta. “Deu uma relevância muito maior nas postagens e um alcance muito maior. Conseguimos um bom número de seguidores, aumento de visitas nos perfis, de engajamento e de feedback, respostas e comentários. A gente teve um bom retorno com os impulsionamentos”, explica.


Seu coordenador de campanha, entretanto, afirma que no início da campanha não possuíam familiaridade com a questão dos impulsionamentos, até mesmo por conta da série de regras e burocracias que envolvem o processo. De acordo com ele, os conteúdos começaram a ser impulsionados após verificar que os adversários estavam se utilizando da ferramenta. "Foi utilizado esse elemento para impulsionar nossa campanha, para que ela tivesse mais visibilidade, mas mesmo assim, nós tivemos muito menos despesa do que nosso adversário", comenta Lunardi.


Segundo dados de prestação de conta das campanhas disponibilizados pelo TSE, João Rodrigues teve despesas de R$ 31 mil reais com impulsionamentos, o terceiro maior de sua campanha. O segundo colocado, Cleiton Fossá (MDB), que obteve 20,72% dos votos, teve gastos de R$ 35 mil reais, também o terceiro maior de sua campanha. Já Cláudio Vignatti (PSB) teve despesas de mais de R$ 60 mil. Este foi o maior gasto da campanha do terceiro colocado, que obteve 19,50% dos votos.


Estes dados de extrema importância para entender a consolidação de um novo modelo de se fazer campanha, também comprovam a persistente preferência do eleitor pela campanha presencial, em que o político tem contato com o público, realizando visitas e eventos, mesmo que contrariando as recomendações de segurança.


O candidato realizou quatro carreatas, que foram transmitidas ao vivo no Facebook. A quinta, que seria realizada no dia antes das eleições, foi cancelada para evitar os riscos de contágio.

(Créditos: Ascom João Rodrigues/Leandro Schmidt)


Entretanto, a maioria dos eleitores que responderam à pesquisa colocaram que o desempenho de seu candidato foi cauteloso quanto os riscos de contágio nas ações realizadas pelo seu candidato: 65,5%. Dentre as ações que mais surtiram efeito para contornar este impasse, as mais citadas foram o uso de máscaras, a higienização das mãos, o distanciamento social ao evitar aglomerações e contatos físicos e a opção de focar na campanha online.


Já 24,1% dos participantes responderam que seu candidato fez movimentos arriscados quanto ao risco de contaminação. Foi observada uma visão negativa sobre as passeatas, carreatas, visitas, o não uso das máscaras, aglomerações e contatos físicos, as persistentes visitas e a distribuição de mídia impressa.


Os participantes classificaram as movimentações de seus candidatos em quatro níveis, observando os cuidados e o respeito com as medidas de segurança.


Lunardi afirma que João Rodrigues foi muito cauteloso em relação aos cuidados para evitar a contaminação durante a campanha. De acordo com ele "o nosso candidato, nos eventos que ia, sempre procurou se precaver com o uso de álcool, fazendo higienização das mãos, a equipe que acompanha também, usando máscaras", porém, durante a campanha, o candidato João Rodrigues apareceu diversas vezes sem o uso de máscaras e sem respeitar o distanciamento recomendado.


Também, quando perguntado sobre a estratégia que recebeu maior atenção durante a campanha, apesar do momento requer atenção em relação aos contatos pessoais, Lunardi diz que o maior foco foram as visitas presenciais, e que "o candidato trabalhou muito nas casas, fez bastante contato, o tempo todo, esse foi o maior foco. O segundo maior foi a produtora da campanha, a empresa encarregada do marketing da campanha foi bastante priorizado, o trabalho de mídia”.


Entretanto, Hugo Gandolfi de Oliveira destaca a maneira como os candidatos souberam, em suas respectivas campanhas, adequar-se diante da impossibilidade de tocar uma campanha tradicional, de maior contato entre as pessoas. “A grande lacuna foi a falta de aprofundamento na apresentação das propostas, de forma que o eleitor ficasse melhor informado das linhas previstas para atuação, nos respectivos cargos, por parte de quem concorria a prefeito e vereador”, comenta.


O jornalista ressaltou também a preocupação de alguns candidatos com pós-pandemia e as medidas necessárias para o enfrentamento, especialmente na área da saúde pública e da educação.


João Rodrigues se reuniu com empresários e trabalhadores a fim de conquistar maior apoio. No registro, apenas uma pessoa usa máscara, e o distanciamento social não é respeitado.

(Créditos: Ascom João Rodrigues/Leandro Schmidt)


 

O que vem depois?


Dez dias após as eleições, no dia 25 de novembro, as enfermarias destinadas para a internação de pacientes diagnosticados com coronavírus nos hospitais públicos e privados de Chapecó alcançaram a lotação máxima, e a região Oeste de Santa Catarina retornou ao risco Gravíssimo de contágio. Na data, o município registrou 10.046 casos confirmados, com 1.038 ativos e 88 óbitos.


Um dos assuntos que mais permearam os debates e falas dos candidatos foi as ações de recuperação do município após a Covid-19, tanto na área da saúde quanto na economia.


Perguntado sobre como pretende lidar com as consequências e uma possível segunda onda da pandemia em Chapecó, João Rodrigues respondeu que em seu mandato irá tomar os cuidados e seguir as orientações dos profissionais da saúde, apesar de não ter nenhuma pretensão de fechar os estabelecimentos. Além disso, o Prefeito Eleito não respondeu nada concreto sobre uma futura vacina, nem sobre a obrigatoriedade ou não de seu uso, apenas que devemos esperá-la.


Diante de um cenário tão crítico e de uma crescente de casos de coronavírus ainda não vista em Chapecó, o próximo Prefeito defende que “temos que conviver com a doença, produzindo e tomando os cuidados necessários”. Ademais, Rodrigues não apresentou propostas firmes para frear o os danos causados pela Covid-19 na cidade que está entre as dez mais afetadas em Santa Catarina.


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